Um dos maiores prejuízos que o preconceito causou à humanidade foi o início tardio das pesquisas antropológicas no Continente Africano. Em meados do século XIX, Charles Darwin supôs que as origens do homem estariam vinculadas a este continente, uma vez que os primatas mais parecidos com o homem, o gorila (Gên. Gorilla) e o chimpanzé (Gên. Pan), lá estariam. Àquela época as cortes reais ainda sustentavam seu esplendor às custas da mão-de-obra escrava. O Brasil, por exemplo, só libertou seus escravos, teoricamente, em 1888, quase vinte anos após a publicação do título darwiniano A Descendência do Homem (1871), que apontava a origem afro da espécie humana. Àquela época apenas o Homo sapiens neanderthalensis havia sido descoberto na Alemanha, mas em sua abusiva perspicácia, Darwin centrou seu espírito científico no continente africano para buscar a real origem dos ancestrais do Homo sapiens sapiens.
A antropologia mundial não admitia, em nenhuma hipótese, que o Continente Negro, a África, fosse capaz de abrigar a mais importante espécie viva da Terra. A descoberta de outros importantes fósseis de hominídeos na Europa e na Ásia serviram para aumentar a aversão às pesquisas na África. Em 1931, o paleontólogo Louis Leakey deu início a uma discussão junto ao Conselho de Pesquisa da Universidade de Cambridge, pois sua intenção era estabelecer na África Oriental sua base de pesquisa de campo, em busca de fósseis humanos. O Conselho de Cambridge insistia para que Leakey concentrasse seu trabalho na Europa e na Ásia, numa típica discriminação. Mas Leakey venceu a queda-de-braço e estabeleceu-se no Quênia, nação onde fora criado.
Grande parte dos fósseis de hominídeos e de macacos humanóides até aqui descobertos são africanos. Podemos citar os principais como: Aegyptopithecus (descoberto em 1960 no Deserto de Fayum); o Moeripithecus (descoberto em 1996 em Omã); o Ardipithecus (descoberto em 1994 na Etiópia) e a famosíssima “Lucy”, o Australopithecus africanus (macaco do sul da África). São descobertas africanas ainda: o Paranthropus robustus (ou Australopithecus robustus), o Zinjanthropus boisei ( ou Paranthropus boisei), Proconsul africanus (1931), o Kenyapithecus ou Ramapithecus (1960), o Victoriapithecus (1966) e a famosa série do gênero Homo (Homo habilis, Homo ergaster e Homo rudolfensis) descoberta entre 1963 e 1968 pelos membros da família Leakey (Louis, Mary, Jonathan, Tobias, Napier e Richard - pai, mãe e filhos), além do “Garoto de Turkana”, um Homo erectus, descoberto por Richard Leakey em 1984.
Concluímos oportunamente que a discriminação de um modo geral, especialmente a racial, afeta as mais inusitadas áreas do conhecimento humano, inclusive o próprio conhecimento sobre as origens do homem. Mas é provável que, pelo menos no campo da ciência, um pouco do preconceito tenha se perdido na própria ânsia da descoberta. É provável que o Conselho de Cambridge, nos primórdios da década de 1930, tenha agido ainda sobre a batuta da insana valorização da raça ariana, que poucos anos depois faria eclodir sobre o mundo o mais cruel dos conflitos militares armados, a II Grande Guerra Mundial.
Pelo menos é o que esperamos e acreditamos.